quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

A volta do beija-flor

Vai tira o destino na sorte
parte em passo quebrado

feito gato preto na sombra
saltando alcova e telhados
chega como um velho freguez

com seu estandarte aberto
alegrando os corações
jogados do lar pros butecos

abre o pátio ardento do povo
chacoalhando feito um ganzé
explodindo feito um tufão
no carnaval da ida sem ré
Edson Neves


(Valeu-velho-irmão!!!)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Passos leves


Quando chove canivetes
aproveito pra descascar laranjas

Quando alguém me diz -Adeus!
Dai eu digo -Você quem manda!

Em meio a crianças
(não me rogo)
danço cirandas

Quando o carro quebra, sigo à-pé
pelas estradas, dou umas bandas

Procuro não me estressar com nada
Nem mesmo com
a classe-sem-classe-hoje-calada

Mas sempre de olho nos bambas
dai quando o vento soprar,
quando a banda tocar,
de certo estou pronto pro Samba...

Fábio Che

Ana Teresa

E era Ana Teresa
dotada de inaldita beleza

Com seus seios...de pele alva,
bicos duros, perfumados,
consistentes e macios como que
duas pêras, uma dádiva da natureza

Com seus castanhos cabelos...
cujo perfume se podia sentir a uma légua
caídos sobre o rosto,
feito crína de selvagem égua

E suas costas delicadas
E suas largas ancas
E sua bunda que parecia
duas colinas brancas

Olhar que perdido no espaço
combinava ao leve gingado
dos quadris em seus felinos passos

Um corpo em brasa, faíscas e centelhas
e suas delicadas mãos de unhas vermelhas

E suas pernas torneadas...
que eu preferia escancaradas
exibindo um sexo, de finos lábios
e poucos pêlos
destacando seu suculento e saliente grelo

E seus traços de inocência. Contraste!
Com seu sorriso de prazer beirando a indecência
Ana Teresa... Sagacidade!
Castração da castidade!

Por vezes ainda sinto entre os dentes
o sabor de tua carne.

Walter F. Sampaio

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Samba e amor

Eu faço samba e amor até mais tarde
E tenho muito sono de manhã
Escuto a correria da cidade, que arde
E apressa o dia de amanhã

De madrugada a gente ainda se ama
E a fábrica começa a buzinar
O trânsito contorna a nossa cama, reclama
Do nosso eterno espreguiçar

No colo da bem-vinda companheira
No corpo do bendito violão
Eu faço samba e amor a noite inteira
Não tenho a quem prestar satisfação

Eu faço samba e amor até mais tarde
E tenho muito mais o que fazer
Escuto a correria da cidade, que alarde
Será que é tão difícil amanhecer?

Não sei se preguiçoso ou se covarde
Debaixo do meu cobertor de lã
Eu faço samba e amor até mais tarde
E tenho muito sono de manhã

Chico Buarque de Olanda

Uma dama em minha cama

Chegou com olhar firme e passos
timidamente determinados
em minutos entrelaça-mo-nos os lábios

E o ballet das línguas
E a dança das mãos
O entrelaçar dos dedos

Os corpos que buscavam o encaixe perfeito
O vagabundo e a dama
entrelaçados
rolaram até a cama

Dai o "jogo do despir"
(os dois qual criança com novo brinquedo)
tirar as roupas, a cada milímetro
desvendando segredos
todos minuciosamente
examinados
devassados
por olhos,
boca,
língua,
e dedos

Olhares de tesão arrojados
mãos que seguravam um ao outro
como quem segura
para que de ti não fuja o pecado

A canção dos suspiros
a ser lapidada
por bocas secas e línguas molhadas

Seu corpo estendido na cama
o umidecer dos dedos
no sexo molhado da dama,
em silêncio de noite calada
que só os gemidos profanavam

Em nossos corpos o fogo ardia
em nossas bocas
o sexo alheio de tão quente,
dava a impressão que derretia

E ao penetrar em tal dama sentia
(eu que não rendo tributos a magia)
como que surgido um Sol na noite
e uma Lua-cheia ao meio dia

E a rígida dança dos corpos
E o ballet da primavera
ou ainda a primitiva-dança-da-vida
que a natureza perpetua através das eras

Suas unhas em minhas costas cravadas
seus cabelos que minhas mãos seguravam
seu sexo preenchido a cada estocada
e os urros selvagens que o ar habitavam
no auge da euforia o gozo,
que de tão intenso,
intensidade não definia

Hora estava a dama a meu lado
outrora presente sua ausência se fazia
e partira como chegara,
assim como
o primeiro filme-álibi
que
nunca terminara...

Walter F. Sampaio

Aula de vôo

O conhecimento
caminha lento feito lagarta.
Primeiro não sabe que sabe
e voraz contenta-se com cotidiano orvalho
deixado nas folhas vividas das manhãs.

Depois pensa que sabe
e se fecha em si mesmo:
faz muralhas,
cava Trincheiras,
ergue barricadas.
Defendendo o que pensa saber
levanta certeza na forma de muro,
orgulha-se de seu casulo.

Até que maduro
explode em vôos
rindo do tempo que imagina saber
ou guardava preso o que sabia.
Voa alto sua ousadia
reconhecendo o suor dos séculos
no orvalho de cada dia.

Mas o vôo mais belo
descobre um dia não ser eterno.
É tempo de acasalar:
voltar à terra com seus ovos
à espera de novas e prosaicas lagartas.

O conhecimento é assim:
ri de si mesmo
E de suas certezas.
É meta de forma
metamorfose
movimento
fluir do tempo
que tanto cria como arrasa

a nos mostrar que para o vôo
é preciso tanto o casulo
como a asa


Mauro Iasi

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Ultimo dia

Meu amor
O que você faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Ia manter sua agenda
De almoço, hora, apatia?
Ou esperar os seus amigos
Na sua sala vazia?
Meu amor
O que você faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Corria pr'um shopping center
Ou para uma academia?
Pra se esquecer que não dá tempo
Pro tempo que já se perdia?
Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Andava pelado na chuva?
Corria no meio da rua?
Entrava de roupa no mar?
Trepava sem camisinha?
Meu amor
O que você faria?
O que você faria?
Abria a porta do hospício?
Trancava a da delegacia?
Dinamitava o seu carro?
Parava o tráfego e ria?
Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria?
Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz ...
o que...
você...
faria???

Paulinho Mosca

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Mais do Mesmo???

PREFÁCIO
"Estudantes insatisfeitos ocupam universidade
exigindo contratação de mais professores,
a real construção de mais salas de aula
além de reformas em sua gestão.
A reitoria logo chama a polícia que violentamente
desaloja os manifestantes.
"(Notícia de maio de 68 em Sorbonne, Paris)

Maios do mesmo?

Meus professores
sempre falaram
com fogo nos olhos
de 68..
E agora falam
com fogo no rabo
deste maiode 2007.

POSFÁCIO
"Vivemos há muitos anos uma vida política nacional
dePlena Democracia e de Estado de Direito.
A atuação predatória de cidadãos que gozam deprivilégios,
ao promover invasão de espaço público,
constranger servidorese impedir atividadesadministrativas,
de ensino e pesquisa desta Universidade,
constitui ação de má-fé que extrapola os limites dalei,
tangenciando ocrimecomum.
"(Abaixo-assinado de professores das univ.
públicas paulistasmaio de 2007 contra os estudantes que ocuparam diversas
universidades em protesto contra os decretos do governadorSerra no estado de São Paulo, Brasil)
Jeff

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Leão do Norte

Sou o coração do folclore nordestino
Eu sou Mateus e Bastião do Boi Bumbá
Sou o boneco do Mestre Vitalino

Dançando uma ciranda em Itamaracá
Eu sou um verso de Carlos Pena Filho
Num frevo de Capiba
Ao som da orquestra armorial

Sou Capibaribe
Num livro de João Cabral
Sou mamulengo de São Bento do Una

Vindo no baque solto de Maracatu
Eu sou um alto de Ariano Suassuna
No meio da Feira de Caruaru
Sou Frei Caneca do Pastoril do Faceta
Levando a flor da lira

Pra nova Jerusalém
Sou Luis Gonzaga
E eu sou mangue também
Eu sou mameluco, sou de Casa Forte
Sou de Pernambuco, sou o Leão do Norte
Sou Macambira de Joaquim Cardoso
Banda de Pifo no meio do Canavial
Na noite dos tambores silenciosos
Sou a calunga revelando o Carnaval
Sou a folia que desce lá de Olinda
O homem da meia-noite puxando esse cordão
Sou jangadeiro na festa de Jaboatão
Eu sou mameluco, sou de casa forte,
sou de Pernambuco
eu sou um Leão do Norte...


Lenine

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Ode ao burguês

Eu insulto o burgês!
O burguês-níquel, o burguês-burguês! A digestão bem feita de São Paulo!
O homem-curva!
o homem-nádegas!
O homem que sendo francês, brasileiro, italiano, é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas! os barões lampiões! os condes Joões! os duques zurros! que vivem dentro de muros sem pulos, e gemem sangues de alguns mil-réis fracos para dizerem que as filhas da senhora falam o francês e tocam os "Printemps" com as unhas!
Eu insulto o burguês-funesto!
O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições!
Fora os que algarismam os amanhãs!
Olha a vida dos nossos setembros! Fará Sol? Choverá? Arlequinal!
Mas à chuva dos rosais o êxtase fará sempre Sol!
Morte à gordura!
Morte às adiposidades cerebrais
Morte ao burguês-mensal! ao burguês-cinema! ao burguês-tílburi!
Padaria Suissa!
Morte viva ao Adriano! "
_ Ai, filha, que te darei pelos teus anos? _ Um colar...
_ Conto e quinhentos!!!
Mas nós morremos de fome!"
Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma!
Oh! purée de batatas morais!
Oh! cabelos nas ventas! oh! carecas!
Ódio aos temperamentos regulares!
Ódio aos relógios musculares!
Morte à infâmia! Ódio à soma!
Ódio aos secos e molhados!
Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos,
sempiternamente as mesmices convencionais!
De mãos nas costas! Marco eu o compasso!
Eia! Dois a dois! Primeira posição!
Marcha! Todos para a Central do meu rancor inebriante!
Ódio e insulto!
Ódio e raiva! Ódio e mais ódio!
Morte ao burguês de giolhos, cheirando religião e que não crê em Deus!
Ódio vermelho!
Ódio fecundo!
Ódio cíclico!
Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora o bom burguês!...
Mário Raul de Morais Andrade

Mago das mágoas

Pois venho no vento
de um lago sem águas
sou poeta viajante
o mago das mágoas
navegante
de um lago de rimas
A quem chamo
carinhosamente
de lágrimas


Leandro Walquer