quarta-feira, 11 de julho de 2007

Fragmento


"por esta solidão, que não consente
nem do sol, nem da lua a claridade,
ralado o peito já pela saudade
dou mil gemidos à marília ausente:

de seus crimes a mancha inda recente
lava amor, e triunfa da verdade;
a beleza, apesar da falsidade,
me ocupa o coração, me ocupa a mente:

lembram-me aqueles olhos tantadores,
aquelas mãos, aquele riso, aquela boca suave,
que respira amores...

ah! trazei-me, ilusões, a ingrata, a bela!
pintai-me vós, oh sonhos, entre flores
suspirando outra vez nos braços dela!"

Bocage

(Enviado por Thais Gonçalves Leite)

quinta-feira, 5 de julho de 2007

Sentença

E junto

a ti

assim, como broto bem cuidado,

senti-me crescido

E quando decidistes partir

como se a terra racha-se, deixando por solo o vazio

senti-me como que desterrado, perdido

e com tolice desesperada disse-te para ficar

só mais essa madrugada


Quando fostes, ainda imaturo

jurei que o ar me abandonara

Mas quando do quarto-fosso escuro sai

e de súbito fora, novamente, tomado

pelas luzes da cidade

com o ar a plenos pulmões

assim bestificado te escrevi

encantado com o fim das ilusões

Com a saudades feito poças de sangue
escorridas pelo chão

e já varridas pelas chuvas da idade

"minha amada, obrigado por me condenar a tamanha liberdade"!!!


Fábio Che



Vôos metálicos


E a relidade era cega

em meio ao escuro tateávamos
enquanto borboletas metalicas

rangiam suas assas reluzentes

Ensimesmadas...

Auto-(in)suficiente caminha va

o novo velho ser decadente

acompanhando a disonante-estridencia

da singular canção da solidão,

inerente ao homem de nosso tempo

entre os detritos da bestialidade

Nos esgotos dos sentimentos humanos

O unico alento, era saber das coisas o seu movimento...

quarta-feira, 4 de julho de 2007

Tênue


Com todo amor que me odiavas
Com teus afagos que me abriam Chagas
Com teu beijo docemente Cancerígeno
E cada delicado jesto, com os quais
Em tua meiguisse me atacavas
E o teu maldito silêncio
Que como que me antecipando,
Vinha de encontro ao meus anseios
Aplacando-me a sede de
Calar com a desconsertante atenção
Que a mim dispensavas
Com teu doce abraço que me estrangulava
E ofertava-me teus seios, entre os quais
Embrenhava-me e onde deliciosamente
perfumando-me, me fustigava
Assim eu fora teu, e tu também foras minha
A ti sempre retribui, com todo o ódio que por ti senti,
E que trasmutado em seu contrário se apresentava...
Oh, cara e amada chaga...
Fábio Che

À MUSA


Quanto, à noite, espero a tua chegada,
a vida me parece suspensa por um fio.
Que importam juventude, glória, liberdade,
quando enfim aparece a hóspede querida
trazendo nas mãos a sua rústica flauta?
Ei-la que vem. Soergue o seu véu,
olha para mim atentamente.
E lhe pergunto: "Foste tu quem a Dante
ditou as páginas do Inferno?". E ela: "Sim, fui eu".

Do Livro "Anna Akhmátova - Poesia: 1912-1964"
Tradução de Lauro Machado Coelho
Editora L&PM, 1991.

(enviado por Roselita Campos)

Versos Íntimos


Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.

Somente a Ingratidão - esta pantera -

Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!

O Homem, que, nesta terra miserável,

Mora, entre feras, sente inevitável

Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa ainda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,

Escarra nessa boca que te beija!


Augusto dos Anjos